quinta-feira, agosto 01, 2002
See that's my grave
Há dias que não quero nada, não vejo nada, não faço nada. Há dias que deito no meu quarto encarando a rua, vendo o asfalto brilhar, o teto escurecer, e não me vem nada à cabeça.
Nada.
Há dias que espero alguma coisa acontecer, alguma coisa parar de acontecer, alguma luz, alguma coisa afiada que corte o tédio, alguma coisa que me dê alguma outra coisa, qualquer alegria ou qualquer dor. Raiva, até. Esperança não. Cansei de esperar. Dei tanto do que não tinha que agora estou devendo à mim mesma e não tenho como pagar. Dei tudo, joguei pela janela do carro em movimento, joguei na grama, esperando que nascesse algo bonito para encher meus olhos. Mas não choveu e alguém acabou pisando em tudo, matando tudo, e eu morri.
Há dias que não vejo nada, não faço nada, não tenho vontade de nada. Não quero que me amem, não quero que me gostem, os abraços não me tocam, meu corpo está anestesiado.
Quero você. Querer você acaba comigo.
Não sinto mais dor, não sinto mais nada. Meu coração não bate mais. Não vai mais bater.
Algumas coisas ainda me fazem sorrir de leve, mas aquele sorriso que você viu é história. Acabou.
Perdi todas as minhas frases. Sangrei tanto que não tem mais o que escorrer. A parede está vermelha, quase secando. Todo meu sangue.
Há dias que desisti de tentar levantar e sobreviver, e viver, renascer. Queria sofrer de novo, só pra lembrar de como foi bom. Não amo nem odeio. Não ando nem para frente, nem para trás. Duvido que sequer exista.
Abandonei a todos, abandonei a mim. Tudo que eu dizia e acreditava, eu abandonei. Não sei onde deixei. Perdi. Perdi tudo. Não quero encontrar. Não quero vozes ou música ou cores ou luz. Meu último desejo já me foi concedido. Meu coração vagabundo e moribundo explodiu de alegria e morreu de tristeza com você, o tempo todo. Quando você foi embora, ele se atirou atrás e ficou estatelado na calçada, mais um no seu rastro, mais um na sua coleção. Eu disse que não sairia do seu lado e não saí mesmo. Preferi morrer. Não tenho mais o que pedir. Mortos não pedem. Não querem. Não existem. Só passam, os dias correm e o esquecimento chega devagar, como o outono nas folhas mortas que cobrem o chão, que cobrem meu túmulo. Me traga flores uma vez por ano, no aniversário do homem. Flores, uma garrafa de vinho e uma carteira de Luckies. Eu vou sorrir e te perdoar pelo que você não fez. Vou sorrir lá de cima, e minha alma estará salva.
.: Clara Averbuck :. 7:16 PM
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