quarta-feira, junho 19, 2002
Waiting for the Sun
[19'10]
Meus queridos leitores.
Meus amados leitores, me desculpem o sumiço. Mas a situação está realmente foda. E para melhorar, estou usando o pior mouse da história da humanidade.
Não sei como não cortaram a água ainda. Francamente. Talvez a Dona Antônia tenha pago, vai saber. Talvez ela não seja uma velha tão má assim no fim das contas. Ou talvez o pessoal da companhia aquática tenha errado feio nas contas a ponto de não se tocar que ninguém paga a água deste apartamento há quatro meses.
Dois dias sem pegar emails. Espero sinceramente que o uol tenha espaço ilimitado, porque há dois dias tinha uns 200 emails na minha caixa postal. Meu celular está sem créditos e não tem papel higiênico na minha casa. meus amigos estão cheios de problemas e não podem me ajudar. Minha dieta tem se limitado a barras de cereais e chás. O que não é de todo mal, porque ando cabendo em calças onde não pensava sequer em botar a panturrilha há tempos. Sorte que me sobraram algumas boletas da alegria, ou eu estaria passando fome de verdade. Não que eu me importe. Quem passou fome na Inglaterra, passa fome em São Paulo na boa. Ou vai comer coco na beira da praia no Rio. Depois ainda perguntam.
Acho que decidi onde vai ser meu lançamento. Queria muito fazer no Mercearia, que é *meu* bar, onde bebo, escrevo, ganho pôsteres, compro bombril, amaciante e livros fodões. Mas acho que é pequeno. Talvez role um off-lançamento para amigos e leitores, sei lá. Mas o lançamento mesmo vai ser no Astor - Cozinha Boêmia, que também é absolutamente do caralho. Mai detalhes quando eu souber mais detalhes.
Aiai.
Cheguei agora ao fundo do poço e ao auge da cara de pau. Sei que tem muita gente querendo me ajudar e não estou em condições de recusar ajuda. É o seguinte. Minha conta está negativa. -9 reais. Estou aceitando qualquer contribuição. É sério. Se banco aceitasse depósito de passe de metrô e passagem de ônibus ajudaria bastante.
Andei cogitando voltar a trabalhar e parar com esse negócio de ficar o dia inteiro escrevendo. É uma linda e nobre decisão, mas tá foda. Eu agüento, eu agüento, mas ficar sem dinheiro para comprar papel higiênico é o fundo do poço. Ontem eu roubei um rolo da pizzaria aqui embaixo, mas já acabou. Pensei em vender o corpo, não me parece uma idéia tão ruim. Sabe, sou gatinha e tudo, aposto que algumas pessoas pagariam por mim. Podendo escolher, não seria nada além de fazer sexo, o que é bom, e receber uma grana no final, o que é melhor ainda. Poderia também ser stripper no escuro, para esconder as estrias. Ou cantar em uma banda cover. Ou cantar jazz deitada em cima do piano. Talvez contar piadas no microfone de algum restaurante com um saco na cabeça. Será que me levariam a sério enquanto piadista? Qualquer coisa que seja à noite e não ocupe meu cérebro está valendo. Parei de trabalhar porque percebi minha energia criativa sendo sugada para o trabalho. Isso não pode acontecer. Não pode. Keep writing, the rest is bullshit. Não quero virar o Fante, não quero, não quero, não posso me vender.
Isso me lembra o menino que eu amava. Ele disse que me vendi. Olhou para o original do meu livro, amarrado com uma fitinha cor-de-rosa e com uma dedicatória para mim mesma ("my own signed copy!"), entortou o nariz lindo dele e disse "você é foda, mas se vendeu". Não, meu querido. Eu não me vendi. Só faço o que gosto e acredito, não me vendi. Teria me vendido se trabalhasse para a televisão ou para o cinema, teria me vendido se fizesse algo que não acreditasse só por dinheiro. Não faço nada por dinheiro. Prefiro vender meu corpo a vender minha alma.
Minha pimenteira está morrendo. As pimentinhas estavam todas secas e amareladas, então arranquei e joguei as sementinhas na terra. Hoje cantei para ela e reguei e fiz carinho e disse para agüentar firme, porque logo as coisas melhorariam e nós sairíamos desta casa feia e boba e iríamos para o hotel da pracinha. Poxa, ela é a minha pimenteira, precisa ser forte. Tomara que ela tenha entendido. Eu ficaria realmente triste se a minha plantinha morresse.
Uma vez eu tive um peixinho, um beta azul chamado Fleash. Ele me escutava e me olhava com sua cara de peixe através do aquário. Não era brilhante nem nada, mas juro, era mais expressivo do que a maioria dos peixes que vejo por aí. Um dia fui trocar a água do Fleash e a droga da água estava muito fria. Assim que o coloquei de volta no aquário, ele abriu as guelras, virou de barriga e morreu. Cara, nunca me senti tão mal em toda a minha vida. Eu matei meu peixe. Matei o Fleash. Não chorei, mas fiquei muito triste. Que merda de dona de peixe que sou. Matei meu peixe com água fria e acabei tendo que jogá-lo na privada por falta de opção. Ia fazer o quê, enterrá-lo? Acho que não. Sou contra enterros, não me agrada a idéia de carne apodrecendo cheia de vermes debaixo da terra. Também não poderia queimá-lo, porque o cheiro de peixe frito me faria sentir ainda pior. Jogar no lixo, fora de cogitação. Acabei jogando na privada mesmo, sempre lembrando do clássico Alligator e achando que Fleash voltaria um super peixe azul e malvado e com raiva dos humanos. Ele nunca voltou. Tudo bem, Fleash deve estar pulando bem feliz no céu dos peixinhos, onde não existem aquários nem donas idiotas que usam água fria demais nem imbecis que derramam óleo e merda na casa dos outros.
Preciso ir. Minha amiga dorme cedo e não consigo usar este mouse. Rezem por mim, queridos.
.: Clara Averbuck :. 9:38 PM
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