i gave my life to a simple chord

sexta-feira, junho 21, 2002

Pergunte ao Pó

Sequei.
Acho que é saudade.
Saudade que não me deixa em paz. Que levou minha paz embora, me cortou com um bisturi e não se deu o trabalho de costurar depois. Me deixou aberta, exposta ao pó e às moscas. Queria que eu apodrecesse como você.
Mas eu não apodreço.
Não eu, meu querido.
Meu falso amor.
A mentira mais linda que já me contaram, o desperdício mais maravilhoso que já vi. Um oásis no deserto, miragem do inferno no meu caminho. Acenou e sorriu de longe para que eu mergulhasse, o demônio surrurando as palavras certas no teu ouvido.
Quando fui te tocar, você sumiu. Não era real.
Pergunte ao pó, meu querido, ao pó que entope teus poros e seca o que você chama de coração. Não passa de um torrão de terra vermelha, morta, infértil.
Você está morto.
Morto.
Morto em mim.
Pergunte ao pó. Ele não vai responder. Vai voar no teu rosto, encher teus olhos e te manter cego no chão, onde você escolheu ficar.
Eu não.
Posso qualquer coisa. Posso voar para onde quiser. E voarei para longe de você, muito longe, onde eu possa lavar minhas asas imundas e deixá-las branquinhas de novo, imaculadas, limpas e livres das tuas lindas mentiras sujas.
Pergunte ao pó, meu querido.
Ele não vai responder.
Nem eu.
E você vai apodrecer sozinho no deserto. Isto é uma maldição. Sozinho no deserto, sem conseguir abrir os olhos, sem conseguir enxergar nada, sem saber para onde ir. Você está perdido no deserto. Perdido e sozinho. E vai secar aí, como a arvorezinha na beira da estrada.
Sozinho. E morto.

Para Flávio de Castro, meu falso amor perdido.

.: Clara Averbuck :. 4:49 AM

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